segunda-feira, 21 de maio de 2012

Improvável




Na terra espremida
De um lugar improvável
Segue a vida seu caminho
Na trilha de uma semente.
Por uma passagem torta
Nasce a beleza
Num tom singelo e frágil
Plantada pelo tempo
Sem mãos,
Sem pá,
Só pó.
Do pó se ergue
A vida desbravadora
Vestida de natureza frágil.
Prova clara
De um viver decidido.
Jóia rara
Na terra dos distraídos.


 
Foto:Google
Autor: Marcelo de O. Paschoal
Bhz, 19 de maio de 2012.



TEMPO, ESSE CICATRIZANTE




O que mais nos dói e atrapalha na morte de quem amamos, de imediato, é o desaparecimento súbito do corpo. Essa repentina falta de assunto para os olhos físicos, bem acostumados que são com o tom da pele, o jeito dos cabelos, os diferentes desenhos de sorriso para cada contexto, a linguagem do olhar, a expressão corporal que cada um tem para falar e silenciar. E também o som da risada, o registro da voz, a textura do abraço, músicas que os sentidos ouvem e correm pra contar para o coração.
Fica, de cara, uma ausência esquisita. Esse estranho fechamento das cortinas quando o show continua a acontecer para nós. Essa inexistência física de um lugar para onde ir que nos permita encontrar o que habitualmente encontrávamos. Até nos darmos conta de que existem outros olhos para ver, a tristeza nos perturba. E dói. Dói muito.
Depois que a minha avó morreu, muitas vezes eu me flagrei tirando o telefone do gancho no ímpeto amoroso de ligar para ela para dividir alguma alegria ou algum desconcerto, como eu sempre fazia. Era um embaraço constatar, segundos depois, ao ouvir o sinal da linha, que, pelos meios materiais, não havia um número para o qual eu poderia discar e ela pudesse atender com a voz que era dela. Aquela pergunta rotineira que somente ela fazia: "tudo azul com bolinhas brancas?"
Somente o tempo me trouxe o conforto de aprender a encontrá-la no meu coração. De ouvir as coisas que ela certamente me diria se pudesse me dizer. De ver e sentir o seu sorriso tão nítido, tão próximo, na minha memória, que faz tudo ficar ensolarado, mesmo quando é cinza o céu do meu momento. Ninguém morre quando continua no outro. Mas só o tempo
nos ensina o caminho dessa mágica do amor. Só o tempo, esse cicatrizante.


Autor(a): Ana Jacomo